Situada no sopé da imponente Serra da Bocaina, a
cidade de Bananal vai contando sua história. A cidade já foi uma das mais ricas
do país, quando o café era a principal atividade econômica do país. Seus
principais monumentos têm sua história ligada à produção de café; a Estação
Ferroviária veio da Bélgica a mando dos barões e a Pharmácia Popular, a mais
antiga em funcionamento no Brasil, foi fundada por um francês atraído pela
prosperidade do lugar. Uma caminhada pelo centro histórico nos leva a essas e
outras obras erguidas num tempo de dinheiro farto.
No começo, uma estrada
A necessidade de um caminho por terra entre as capitanias de São Paulo e do Rio
de Janeiro, que evitasse os riscos das viagens marítimas a partir de Paraty.
levou a que em 1725 fossem iniciados os planos para a construção de uma estrada
que só seria concluída na década de 1770. Foi quando o capitão-mor de
Guaratinguetá, Manoel da Silva Reis, por ordem de Martim Lopes Lobo de
Saldanha, do Conselho de Sua Majestade, abriu um caminho "que compreende vinte
e tantas léguas de sertão, que ele fez romper pela serra da Bocaina e
Paraíba".
Para povoar aquelas terras e criar "arranchamentos para comodidade e
necessário sustento dos viandantes daquele novo caminho", foram doadas
sesmarias aos que haviam se empenhado na construção da estrada. Uma dessas
sesmarias, a do rio Bananal, foi destinada a João Barbosa Camargo e sua mulher.
Em 1783, o casal manda erigir em suas terras uma capelinha tosca, dedicada ao
Senhor Bom Jesus do Livramento. Em torno dela, cresceria o povoado de Bananal.
Terras férteis, café e riqueza
Na primeira fase de ocupação do vale do Paraíba, predominava a lavoura de
subsistência com poucos excedentes para serem comercializados. A situação
começa a mudar a partir do início do século XIX, quando a cultura do café,
baseada nas grandes propriedades e no emprego da mão-de-obra escrava, chega à
região. As terras férteis do vale e o clima propício para o café atrairiam
grandes investimentos. A princípio, os lucros obtidos com o café eram aplicados
na compra de mais escravos e na ampliação da lavoura. A vida era austera e as
rústicas sedes das fazendas eram cercadas pelo terreiro de café, oficinas e
senzala. Em 1836, o segundo maior produtor de café da província de São Paulo
era Bananal, que concentrava boa parte dos fazendeiros mais ricos do vale.
Com o fim do tráfico de escravos, os fazendeiros começaram a sofisticar seu
modo de vida. As sedes de fazenda foram transformadas em palacetes, decorados
com móveis importados e afrescos de pintores europeus nas paredes. Aumentava o
número de escravos usados nos serviços domésticos. Bananal chegou a ter duas
bandas de música formadas por escravos, especializadas em óperas européias.
Com a presença da corte portuguesa no Rio de Janeiro e mais tarde a instalação
do Império, o Brasil já não era mais uma colônia e a emergente e poderosa
aristocracia rural adotava o código de conduta, a maneira de morar, se vestir e
se expressar da corte francesa, a mais influente da época. Em Bananal, os
"barões do café" formavam a elite do Império. Com seu dinheiro,
depositado nos bancos de Londres, chegaram a avalizar empréstimos feitos pelo
Brasil para enfrentar a Guerra do Paraguai. Financiaram a construção da Estrada
de Ferro Ramal Bananalense " que passava pelas fazendas mais ricas e iam
até Barra Mansa, no Rio de Janeiro " e trouxeram uma estação ferroviária
inteira da Bélgica. Por algum tempo, a cidade teve sua própria moeda. Um dos
fazendeiros mais poderosos da cidade, Manoel de Aguiar Valim, dono da fazenda
Resgate, teria, ao morrer, em 1878, apenas em apólices da dívida pública, quase
1% de todo papel moeda emitido no Brasil.
A decadência
Mas o período de prosperidade obtido com o chamado ouro verde não demorou a
chegar ao fim. No final do século, as terras começaram a dar sinais de
exaustão, a abertura da ferrovia Santos-Jundiaí veio facilitar o escoamento da
produção de pontos mais distantes do litoral, propiciando a expansão da lavoura
cafeeira no oeste paulista, e a abolição da escravatura, em 1888, enfraqueceu
ainda mais a economia da região. Os filhos dos grandes fazendeiros não
conseguiriam manter as fortunas herdadas dos pais, e, embora as pastagens para
criação de gado tenham tomado o lugar dos cafezais, não foram capazes de
restaurar o poder e a riqueza das famílias de Bananal e de todo o vale,
mergulhadas em brigas por heranças e perdidas na lembrança do período de
glória.
Na década de 50, mais um golpe. A abertura da Via Dutra, rodovia ligando São
Paulo ao Rio de Janeiro, praticamente desativou a estrada dos tropeiros, que
passava por Bananal, além de Areias, Silveiras, Formoso e São José do Barreiro.
Tornaram-se todas "cidades mortas", como escreveu Monteiro Lobato,
que morou em Areias e presenciou a decadência da região.
Agora, o turismo
Bananal procura hoje se reerguer atraindo turistas não só para conhecer sua
história de pompa e riqueza, cujos testemunhos são os belos sobrados da cidade
e os casarões de suas fazendas, mas também para desfrutar das belezas naturais
da serra da Bocaina, onde fica a maior reserva brasileira de mata atlântica.
Seguindo as trilhas que sobem a serra em direção aos campos da Bocaina,
encontramos cachoeiras de águas cristalinas, o ar puro das grandes altitudes e
uma vegetação exuberante. A história está presente em trechos dos caminhos do
ouro, estradas calçadas de pedra pelos escravos, que rompiam a serra, em plena
floresta, chegando até os portos do litoral sul do Rio de Janeiro.
As antigas fazendas de café que circundam Bananal são testemunhos de um período
áureo, em que o café dominava grandes extensões de terra e criava fortunas. Na
Fazenda Resgate, que pertenceu ao vaidoso comendador Manoel de Aguiar Vallim,
todo o brilho do passado imperial manifesta-se no luxo e refinamento de seu
imenso sobrado, um dos mais importantes exemplares da arquitetura neoclássica
da região.
A 25 km
do centro histórico, fica a Estação Ecológica de Bananal, uma área de 884 hectares que
abriga remanescentes da mata atlântica, além de mais de 200 espécies de animais
ameaçados de extinção: o sagüi-da-serra-escuro, a onça-parda, o
cachorro-do-mato e aves como o gavião-pega-macaco, o gavião-pomba, a aratinga,
o jacu e o inhambu-açu. A importância desse ecossistema " que
originalmente cobria todo o litoral brasileiro " fez com que a Unesco
declarasse as áreas em que ele ainda ocorre como patrimônio da humanidade.
Criado em 1971, o Parque Nacional da Serra da Bocaina é a maior reserva
contínua de mata atlântica do país: 110 mil hectares. Sua área abrange seis
municípios, alcançando o litoral na vila de Trindade, em Paraty. A grande
variação de altitude do parque " do nível do mar até os 2.088 metros do Pico
do Tira Chapéu " explica a diversidade de ecossistemas que abriga: ilhas
oceânicas, formações estuárias, encostas recobertas pela floresta tropical,
matas de araucárias e campos de altitude. A região é cortada pela Estrada da
Cesaréia, também chamada Trilha do Ouro ou Trilha dos Mineiros. Construída
pelos escravos no século XVIII, boa parte do seu leito ainda está pavimentado
com grandes pedras. Para percorrer toda a estrada, refazendo o percurso das
tropas de burros que carregavam o ouro de Minas Gerais até o litoral, é preciso
três dias de caminhada.