Contos
Prosa de Pescador
O fim do dia se aproximava. Sobre a serra da Mantiqueira, o sol
parecia apagar-se, tingindo de rubro os fiapos de nuvens que emolduravam os
contornos da serra. As garças levantavam vôo e se recolhiam empoleirando em
suas árvores. Era sexta-feira, hora do peixe frito. No Bar do Peixe lá no bairro
das Pedras hoje São Geraldo onde os piraquara se reuniam para comer curimbatá
frito, beber cachaça e contar causos de pescador. Eles eram em número de uns
seis que ali estavam.
De repente, eis
que surge diante deles Zé Jacinto convidado há tempos pelo Juvenal.
- Ôooo Zé
Jacinto até que em fim você apareceu. - Juvenal disse.
- É só tô de
passagem. – resmungou Zé Jacinto meio sem jeito.
- Senta aí e
toma uma com a gente. – Dito falou. –
Garcia, traga uma cachaça das boas pro o Zé Jacinto.
- Estamos aqui
escutando um causo do Mané Ferpudo. Vaz vinte anos que Ferpudo conta este causo
e até hoje não terminou. – disse Juvenal e todos caíram na gargalhada.
- Ué! Vocês
nunca deixa terminar, sempre estão me interrompendo. – resmungou Ferpudo.
- Sabe Jacinto,
Ferpudo tá tentando contar um causo de um pescador tal de Pedroso que vivia por
estas bandas. Conta aí Ferpudo, conta. – Juvenal disse.
Enquanto Garcia
servia cachaça e peixe frito, Tambira se aconchegou em um velho e tosco banco
de pau.
- Naqueles
tempos vivia por estas bandas um pescador chamado Pedroso...
- Xiiii, já vai
principiar tudo de novo. – interrompeu comentando Ludovico.
Todos caíram na
gargalhada.
- Viu só. Por
isso é que nunca termino de contar o causo. – reclamou Ferpudo.
- Tá bom
continue. – Falou Juvenal.
- Naqueles
tempos...
Burburinho de
risos.
- Naqueles
tempos vivia por estas bandas um pescador chamado Pedroso, um dia ele foi
procurado pelo vigário da Vila de Santo Antônio, o padre Vilela que queria ter
uma prosa com ele. - Ferpudo fez uma pausa para dar uma mordida num curimbatá
frito e tomar um gole de cachaça.
- continua
Ferpudo, continua. – disse Firmino.
- Padre Vilela
queria tratar de uma maracutaia um tanto misteriosa. Na verdade o causo
principia quando um figurão chamado Assumar ia passar por aqui e o padre queria
impressionar o homem. Vocês sabem, vigário gosta de bajular. – Ferpudo fez
outra pausa.
A essa altura
todos já estavam embriagados e a maioria já nem ouvia o que Ferpudo dizia.
- Padre Vilela
disse para o Pedroso encher uns três balaios de peixe e esconder dentro d’água
na curva do rio. – com voz pastosa continuou o Mané Ferpudo. – Ladino que nem
um gato Pedroso fez tudo direitinho...
A esta altura
Ferpudo já estava roncando. Jacinto dá um cutucão no pé de Ferpudo e diz:
- Eita parou por
quê? Continua o causo.
- Então né... -
Ferpudo deu uma parada pra se situar no causo.
Ainda com a voz
pastosa Mané Ferpudo continua:
- Todo bom
pescador sabe que na curva de rio não dá peixe por causa do rebuliço das águas,
mas Pedroso não estava ali pra pescar era só fingimento, então ele e mais dois
companheiro subiam e desciam o rio puxando a rede esperando o sinal pra virar
os balaios de peixe na canoa. Dentro da canoa um embrulho misterioso enrolado
em folha de bananeira.
Depois de um
cochilo a turma toda estava empolgada com o causo de Mané Ferpudo.
- Mais me diga
uma coisa Ferpudo, que maracutáia é essa do vigário? – perguntou Fermino.
- Tá com muita
pressa, espera eu terminar o causo. – retrucou Mané Ferpudo.
- Então vai lá.
Continue. – Dito falou.
- Pois é...
Antes de encher a canoa com os peixes do balaio Pedroso de vez em quando
passava no porto e gritava pra turma que ali estava. Ferputo ficou em pé e
gritou. - Tá ruim hoje não tá dando nada.
- Garcia traga
mai peixe. – alguém da turma gritou.
- Daí veio o
sinal pro Pedroso encher a canoa de peixe. Quando ele chegou ao porto Itaguaçu
com a canoa cheia de peixe a turma ficou espantada. Todos queriam saber como
foi que aconteceu. O dia estava ruim pra pesca, minuto antes à canoa estava
vazia e der repente à canoa estava quase afundando com o peso de tanto peixe. O
que foi que aconteceu? Era a grande pergunta. – completou Ferpudo.
- E daí como foi
que Pedroso se explicou? – perguntou Zé Jacinto.
- Calma que eu
chego lá. - Ferpudo falou.
- Então fala do
embrulho misterioso enrolado na folha de bananeira. – Quis saber Juvenal.
- Óia... o papo
tá bom mais tenho que ir embora se não dona Maria vai por eu pra dormir com o
cachorro. – Ferpudo disse e foi saindo.
- Mas Ferputo
termina o causo. – gritou Juvenal.
- Sexta-feira
que vem eu termino. – gritou Mané Ferpudo.
J.
Carlos Ribeiro