Arqueóloga
Niède Guidon
Com mais de 120 mil hectares de
cânions, grutas, falésias e o rico bioma da caatinga, o Parque da Serra da
Capivara e seu entorno abrigam 1.334 sítios arqueológicos (172 deles abertos a
turistas), pinturas com 29 mil anos de história, paisagens que remontam ao
período pré-cambriano (mais de 570 milhões de anos atrás) e um infindável
cemitério de animais da megafauna: de seus terrenos são retiradas,
periodicamente, ossadas de mastodontes, tigres-dente-de-sabre, preguiças
gigantes (que tinham seis metros e até 700 quilos) e outras espécies extintas
há milênios.
Pintura Rupestre |
Museu e trilhas
Antes de entrar no parque,
porém, é aconselhável que o forasteiro faça uma visita ao museu da Fundação do
Homem Americano (Fundham), instituição da qual Niède é diretora e que preserva
mais de 1 milhão de achados arqueológicos e paleontológicos da região. Com
cerca de cem relíquias em exposição, o local é uma introdução perfeita para as
andanças pela Serra da Capivara.
Lá estão, por exemplo, um crânio
de quase 10 mil anos descoberto no Sítio dos Coqueiros, localizado dentro do
parque. “É um crânio alongado, que pertenceu a um indivíduo que viveu nesta
região”, conta Gisele Felice, arqueóloga da Fundham. “Ele é muito parecido com
o crânio da Luzia [a mulher de 11 mil anos encontrada em Minas Gerais nos anos
1970] e é uma das principais atrações do acervo”.
O museu também preserva colares
de 8.000 anos, ferramentas líticas de 9.000 anos e até fezes fossilizadas com
quase quatro milênios. Também exibe urnas funerárias e explica como as
populações que viveram na área enterravam seus mortos.
Abastecido pelas informações
encontradas no museu, o turista está pronto para suas incursões ao Parque
Nacional. Os passeios devem ser feitos com um guia: os veículos saem da cidade
de São Raimundo Nonato e, depois de 20 minutos, estão cruzando as trilhas
semiáridas da Serra da Capivara, entre mandacarus, xiquexiques e juazeiros.
Novas teorias
Os resquícios de presença humana
encontrados nesses lugares lançou uma nova possibilidade sobre a chegada do
homem ao que hoje são as Américas. Uma das teorias mais aceitas diz que o homo
sapiens entrou na região através do Estreito de Bering (entre os territórios
atuais da Rússia e do Alasca) há cerca de 15 mil anos.
Entretanto, usando técnicas de
datação pelo carbono 14 e por termoluminescência em suas investigações na Serra
da Capivara, as equipes de Niède Guidon chegaram à conclusão de que a presença
humana na área tem pelo menos 100 mil anos de história.
Nos sítios visitados pelos
turistas foram descobertos restos de fogueiras, oficinas líticas, resquícios de
aldeias, cerâmicas, discos polidos e machados lascados. São as pinturas, porém,
que irão receber e encantar os visitantes. “Até hoje me impressiono com a
qualidade dessas obras de arte”, diz o guia Giordano Macedo, olhando o paredão
do Sítio do Meio. “Você pode enxergar movimento nas pinturas e aprender sobre
diversos aspectos da vida dessas pessoas”.
Muitas das pinturas são
narrativas: feitas principalmente com óxido de ferro, elas retratam figuras
antropomórficas e zoomórficas em plena interação. Há duplas (e trios) fazendo
sexo, homens conduzindo rituais, caçadores correndo atrás de animais, mulheres
dançando e até um lindo casal dando um “selinho”.
O turista pode passar dias só
explorando as obras de arte espalhadas pelo parque (o recomendável é que se
reserve pelo menos quatro dias para percorrer a região, visto que os sítios
estão a quilômetros de distância uns dos outros).
Mas, na Serra da Capivara,
também vale a pena praticar um pouco de ecoturismo: os guias geralmente levam
os turistas até locais que oferecem lindas visões da área, que esteve sob o mar
em um passado distante, emergiu da água com o movimento das placas tectônicas e
hoje exibe monumentos como a Pedra Furada (um dos principais cartões-postais da
Serra da Capivara).
As caminhadas podem ser
exaustivas, mas são altamente recompensadoras. Com o semiárido despovoado sob
seus pés, o forasteiro se sente, mais do que nunca, como um explorador
privilegiado de um mundo perdido.
Fonte:
Marcel
Vincenti, UOL
Fundham
Nenhum comentário:
Postar um comentário